Gostaria de enfatizar seis
aspectos importantes da realidade da Amazônia brasileira.
>
1
Em primeiro lugar dizer que o modelo de
desenvolvimento socioambiental, que se fortaleceu a partir da Eco 92 e que
é desenvolvido em pelo menos 45% do território amazônico por populações
tradicionais, agora está mais ameaçado do que nunca.
Em um momento de crise, os povos tradicionais
dessa região têm, um papel fundamental a desempenhar não apenas no
desenvolvimento, mas na própria viabilidade de um futuro para o país. E
precisam ser respeitados em seus direitos territoriais e apoiados por políticas
públicas inclusivas.
>
2
Os principais motores de mudança
identificados para esta região são a alteração do uso da terra e as alterações
climáticas. O desmatamento vem crescendo nos últimos anos, após um período de
dez anos de estabilidade, atingindo 13.235 km2 em 2021 e vem se estendendo para
áreas intactas de floresta localizadas no Sul do Amazonas. Em 2022, os dados do
INPE mostram se o desmatamento continuar no ritmo que está, a cifra para este
ano chegue a 15 mil km² de destruição na Amazônia.
E nos últimos dois anos assistimos um aumento de
queimadas na região, inclusive em Terras Indígenas e a intensificação da
degradação da floresta.
>
3
Houve um desmantelamento generalizado de
órgãos federais e proteções legais está em andamento desde 2019, de forma
organizada, como um projeto mesmo. Outro aspecto, é a redução da participação
popular e de setores da sociedade civil em órgãos como o Conselho Nacional do
Meio Ambiente (Conama) e outros, que reflete o enfraquecimento de um marco
democrático importante no processo decisório.
O poder Legislativo, por sua vez tende a aprovar
projetos de flexibilização da fiscalização das leis, do marco legal do meio
ambiente e do marco legal dos direitos indígenas.
> 4
A extensão dos territórios indígenas e áreas
protegidas representa quase 45% da Amazônia e podem ser os últimos
reservatórios de florestas e biodiversidade (e os benefícios que os
acompanham). Toda essa diversidade étnica e populacional dialoga com o
manejo sustentável para a conservação da biodiversidade e para a manutenção dos
serviços ecossistêmicos. Esses
territórios coletivos e de assentamentos de agricultores familiares são o alvo
principal das disputas na Amazônia na atualidade, juntamente com terras
públicas não destinadas.
>5
É aqui na
Amazônia que estão os piores indicadores sociais do Brasil e onde a violência
se alastra com intensidade. A população possui níveis de pobreza muito elevados
e qualidade de vida muito baixa. Das 10 cidades com piores índices de
atingimento das metas ODS, nove estão na Região Amazônica. Desigualdade social,
desastre ambiental e imensidão territorial são três aspectos importantes a
ressaltar diante dessa crise - são mais de 13 milhões de amazônidas nas piores
condições sociais e de saúde.
O bem-estar e a segurança dos cidadãos na
Amazônia estão em perigo. A floresta está entregue para o crime organizado. O
resultado disso é violência, abusos e ameaças contra as Comunidades Indígenas e
Tradicionais.
A simbiose entre
desmatamento da Amazônia e crime organizado é conhecido. A PF fez 369
operações entre 2016 e 2021 mostra que o crime ambiental fomenta a destruição
da floresta e alimenta, assim, uma cadeia de ilegalidades, que começa pela
invasão das Terras Públicas e se estende a fraudes, homicídios e o comércio de
armas e drogas.
> 6
Os problemas e as realidades complexas da
Amazônia não podem ser resolvidos com modelos de bioeconomia e suas promessas
tecnológicas, que mais se apropriam de saberes tradicionais e se voltam para o
grande mercado ao invés de valorizar seu território. A minha experiência
com parcerias em projetos com as comunidades tradicionais mostra que os modos
de vida e práticas de manejo demonstram forte capacidade de manter a floresta
em pé. Mas essa capacidade de manutenção é quase sempre comprometida quando
interesses econômicos avançam sobre seus territórios. Não podemos esquecer que
os usos da terra dos territórios das populações tradicionais são usados
para garantias de vida, como bem vem sendo colocado nesse fórum e não para
mercantilização e garantir os direitos dessas populações é fundamental.
Existem
dois caminhos para a Amazônia: a destruição e exploração exógena da
biodiversidade ou a sustentabilidade e a consideração do modelo endógeno,
valorizando os povos tradicionais e as necessidades internas de todos os
amazônicos.